AULA 03 - ANTROPOLOGIA
ANTROPOLOGIA
O estudo do homem implica
em entender não só sua evolução e o processo de humanização, mas, principalmente,
o desenvolvimento social, cultural e político; inserindo-se no âmbito das
Ciências Humanas. Dentro das humanidades, encontramos as chamadas Ciências
Sociais, abordando uma imensa gama de subdivisões, entre as quais a sociologia
e a história.
A partir destas duas surgiu
a antropologia, uma irmã siamesa, à medida que é uma ciência auxiliar das
ultimas, a despeito delas também comporem seu arcabouço teórico instrumental. No
entanto, a antropologia no Brasil é conhecida apenas superficialmente.
Primeiro porque não existem
cursos de graduação na área em nosso país, por aqui temos somente mestrados e
doutorados neste segmento, em geral, desenvolvidos por bacharéis e licenciados
em história ou sociologia. A antropologia é, erroneamente, simplesmente
considerada uma pequena parte da sociologia. Depois, porque a antropologia é
interdisciplinar, estando presente em todas as áreas do conhecimento humano e
transitando por todas elas como ciência auxiliar, servindo-se das mesmas como
instrumento de pesquisa, tal como: administração, estatística, psicologia,
economia, pedagogia, biologia, direito e outros segmentos da saúde, exatas e
humanidades. Isto porque todas as ciências convergem para o entendimento do
homem, servindo aos interesses humano, percorrendo caminhos diferentes, mas
paralelos, pelo quais a antropologia transita confortavelmente.
DEFININDO E CONCEITUANDO A
SOCIOLOGIA
Por definição, a antropologia é um dos segmentos da matriz básica das Ciências Humanas, aquela com origem mais recente, embora não menos importante, pois é subsidio para outras Ciências Sociais, incluindo a suas irmãs siamesas: história e sociologia. Etimologicamente, a palavra antropologia deriva do grego anthropos (homem), somado a logos (estudo, razão, lógica).
Neste sentido, a
antropologia é o estudo do homem, com especial ênfase na vida em sociedade e
nos aspectos culturais, interessando-se também pelo individuo e sua psicologia.
Enquanto ciência, surgiu no século XIX, mas só adquiriu status e reconhecimento
ao longo do século XX.
Inicialmente estudava as
populações mais arcaicas, sociedades simples ou ditas “primitivas”; deixando o
estudo das populações contemporâneas, das chamadas sociedades complexas, para a
sociologia. Uma tendência abandonada em beneficio da ampliação do campo de
estudo antropológico a partir da década de 1960, quando foram iniciadas
pesquisas no âmbito urbano atual, onde se insere a antropologia jurídica,
segmento do Direito.
A antropologia se distingue
da sociologia por ser uma ciência que pretende estudar os aspectos sociais pelo
prisma do observado, colocando-se no lugar do outro; enquanto a sociologia
observa a sociedade visualizada por fora, pelo ponto de vista do observador. Igualmente,
enquanto a antropologia organiza os dados em relação às condições inconscientes
da vida social; a historia problematiza a vida social consciente. Embora o
entendimento de um aspecto dependa do outro, visto que as mentalidades e sua
formação é, simultaneamente, objeto de estudo da antropologia, história e
sociologia.
É interessante ressaltar
que esta relação interdisciplinar, fez da antropologia uma ciência
transdisciplinar, que transita por diversas áreas. Entretanto, o que não
impediu a segmentação da antropologia, representada, por exemplo, pela
antropologia jurídica; a qual pretende entender o funcionamento da mente
criminosa a partir de perspectiva, motivações, etapas, etc.
FILOSOFIA DA CULTURA
A vinculação da antropologia com a história e a sociologia é obvia, porém, mais nítida ainda é sua ligação com a filosofia. Não por acaso a cultura é o centro da antropologia, tanto que antes foi chamada de filosofia da cultura.
A antropologia, como a
filosofia, aspira conhecer o “homem total”; diferente da ultima, que pretende
estabelecer a verdade; estuda as produções e representações humanas, analisando
costumes, crenças, leis, instituições, técnicas, relações e estruturas sociais,
objetos físicos com utilidade atribuída pela prática ou significado e até a
linguagem.
Enfim, a antropologia
observa tudo que diz respeito ao homem para melhor entende-lo, mas considera a
construção deste conhecimento apenas uma possibilidade, trabalhando com
verdades provisórias, ou seja, teorias, o que a filosofia não faz.
Humanista na sua essência,
a antropologia estuda a evolução humana, não só no seu aspecto fisiológico, mas
também através de ideias, valores, símbolos, normas, costumes, crenças,
invenções, ambientes, etc.
Configurando uma verdadeira
filosofia da cultura, um pensar tudo que é humano, já que tudo implica em uma
vertente cultural. Configurando uma ciência auxiliar para outras áreas e
constituindo base teórica importante para a sociologia e história. Ao mesmo
tempo carece de ciências auxiliares, além das já mencionadas, tal como política,
geografia, linguística, economia, etc. Assim, é quase tão ampla como a
filosofia, produzindo resultados diferentes, pensando o homem sob outra ótica.
BASE TEÓRICA E PRÁTICA
Dado a amplitude de seu objeto de estudo, o homem em todos os seus aspectos ao longo da variação do tempo e espaço, a antropologia possui inúmeras subdivisões, dentre as quais cabe destacar 4 básicas:
1. Antropologia Pré-Histórica: a qual consiste no estudo
do homem através dos vestígios materiais de cunho arqueológico e pertencente a
paleontologia (estudo dos fosseis, vestígios matérias de organismos vivos),
pretendendo reconstituir a vida de sociedades desaparecidas.
2. Antropologia Linguística: estuda a linguagem em todos
os seus aspectos; transitando pela oralidade, escrita, gestual, simbolismo,
etc; considerados patrimônio de uma sociedade e da humanidade, meio de
expressão de valores, crenças e pensamentos; e não apenas meio de comunicação.
3. Antropologia Biológica ou Física: estuda a evolução do
homem a partir de seu vinculo fisiológico, da distribuição étnica, genética,
geográfica e ecológica (interação do homem com o meio ambiente e alterações na
natureza para adaptar o espaço as necessidades humanas).
4. Antropologia Cultural ou Social: estuda a totalidade
da vida social humana, seus modos de produção, organização política e jurídica,
sistemas de parentescos, sua sistematização do conhecimento, crenças
religiosas, língua, psicologia, criações técnicas, cientificas e artísticas.
Este último segmento, tradicionalmente, sendo mais
amplo que os anteriores, dividiu-se em duas vertentes:
1. Etnografia: Etimologicamente, significa
descrição (grafei = escreverem grego) de um povo ou nação (ethno),
ou seja, descrição de uma cultura.
Termo criado por Bronislaw
Malinowski, antropólogo polonês, em 1922, utilizado na obra Os
argonautas do Pacifico Sul; relato de seu trabalho de campo junto a nativos
das ilhas Trobriand, arquipélago de 440 km quadrados próximo a Nova Guiné, na
Oceania.
É o primeiro passo na
pesquisa antropológica, consistindo, justamente, na pesquisa de campo,
ocupando-se da descrição da cultura estudada; reconstituindo, tão fielmente
quanto possível, a vida de um povo. Englobando métodos e técnicas de
classificação, descrição e analise de fenômenos culturais.
A pesquisa etnográfica
envolve recolher relatos e objetos materiais, observar comportamentos e
costumes do ponto de vista das diferenças; compondo fontes de estudo para a
antropologia e a etnologia, a segunda etapa da tentativa de entendimento do
outro.
2. Etnologia: A partir do grego, a
palavra significa estudo do povo ou nação, sendo um prolongamento da
etnografia, embora sua origem seja anterior à antropologia cientifica. O termo
existe desde os gregos antigos, porém, foi usado pela primeira vez, com o
sentido atual, pelo austríaco Adam Fraz Kollór em 1783, denotando uma ciência
que estuda as origens dos povos.
É o segundo passo da
pesquisa antropológica, ocupando-se do estudo da cultura, em geral, a partir de
dados levantados pela etnografia, investigando e problematizando os costumes
humanos, discutidos pelo viés teórico. Utiliza métodos comparativos, examinando
relatos, objetos, descrições e documentos para elaborar uma síntese do objeto
estudado, orientado pela geografia, história e cultura para entender o outro e
a si mesmo. Embasada em um contexto teórico rico e segmentado, a antropologia
articula-se com a prática, parte da vida cotidiana para entender o homem
através de seu próprio referencial.
OS PRIMÓRDIOS DA
ANTROPOLOGIA
Embora a antropologia tenha se configurado como ciência ao longo do século XIX e XX, alguns teóricos consideram os gregos como inventores do conhecimento antropológico. Na antiguidade, os gregos tenham uma visão etnocêntrica do mundo, considerando outros povos como bárbaros, inferiores desprovidos de atividades civilizadas; despertando a atenção para a questão do outro, a partir do estranhamento, e uma discussão sobre a própria identidade - a forma como enxergavam a si mesmos e o que consideravam características em comum entre eles.
O estranhamento significa a
perplexidade diante de culturas diferentes, fazendo as comparações, utilizadas
para afirmar a superioridade, provocar um olhar para si mesmo e, portanto, o
reconhecimento do que torna o “nós” diferente do “eles”.
Junto com a repulsa,
provocando também um fascínio pelo estranho, investigações foram fomentadas
pelo estranhamento com relação ao outro, a despeito do objetivo de conhecer
para inferiorizar. Uma tradição herdada pelos romanos, para os quais a
preocupação em conhecer o outro na sua totalidade, entendendo suas motivações,
inseriu-se em um objetivo maior: conhecer o inimigo para dominar, dividir para
conquistar.
Os romanos procuravam
conhecer os povos considerados inimigos em potencial para, depois, impor sua
cultura; oferecendo cidadania para alguns, vistos como aliados, enfraquecendo
uma oposição centralizada; enquanto outros povos escravizava, colocando os
aliados para vigiar. Roma administrava as rivalidades em favor dos seus
interesses, fazendo-se necessário conhecer o outro, seu modo de pensar e agir,
para dominar.
O que criou um antagonismo
envolvendo o mundo dito civilizado, herdeiro da cultura greco-romana, em
oposição à barbárie. Depois transferida para o choque de civilizações:
cristandade x islamismo. Cada qual se considerando civilizada em oposição a um
mundo bárbaro.
Não obstante, o
reconhecimento do valor da cultura do outro aconteceu somente com o fim da
Idade Média; a oposição religiosa entre cristandade e muçulmanos impediu
qualquer atributo além de inimigos civilizacionais por excelência. A
antropologia e sua preocupação com o entendimento do outro pelo seu próprio
prisma cultural fez parte da filosofia até o século XIX, iniciando a construção
de sua autonomia somente no século XVIII, com o iluminismo e a enciclopédia. No
entanto, a gênese da reflexão contemporânea antropológica remonta a descoberta
da América, não por acaso nomeada “Novo Mundo”; trazendo à superfície a
diversidade étnica e cultural, estimulando discussões em torna das diferenças
entre povos e características em comum que definem a humanidade.
O século XVI foi marcado
por relatos de cronistas e viajantes descrevendo estranhamentos, o que hoje
pertence à etnografia, mas que na época serviu de base para discutir afinidades
e diferenças entre povos e os limites da humanidade. Em meio a relatos
fantasiosos, que se confundiam com dados concretos reais, discutia-se até que
ponto aborígenes das Américas e de outras partes do mundo realmente pertenciam
à espécie humana, com argumentos utilizados para negar a humanidade e
justificar a escravidão e indígenas e africanos, em um contexto racista e
preconceituoso.
Estas discussões criaram o
conceito de desenvolvimento a partir de um estado primitivo, que justificava o
domínio europeu sobre o mundo; uma vez que a Europa, o Velho Mundo, teria se
aprimorado, atingindo o ápice civilizatório que pretendia propagar. O que
inaugurou a recusa do outro, a despeito de certa admiração pelas sociedades
indígenas, vivendo ao estilo do paraíso cristão. Entretanto, as tentativas de
entendimento do outro, através de sua própria cultura, continuaram distorcendo
a compreensão devido ao referencial centrado no “eu” ao invés do “eles”,
carregado de conceitos pré-concebidos.
Herdeiro do Renascimento,
da substituição do teocentrismo pelo antropocentrismo; das ideias de Copérnico
e Galileu, do racionalismo cartesiano; o século XVIII aprofundou os
estranhamentos do século XVI e XVII, marcou um projeto do que se tornaria os
primórdios de uma ciência do homem. O francês Jean-Jacques Rousseau, ao
escrever O contrato social e A origem a desigualdade
entre os homens, cunhou o conceito de “Bom Selvagem”, silvícola, homem
primitivo vivendo mais próximo do estado natural humano, tal como qualquer um
seria se não tivesse sofrido o processo civilizatório; observando e descrevendo
o outro, isentando-se de valores morais, religiosos ou políticos. Tendo como
problemática central a relação entre natureza e cultura, Rousseau colocou o
homem civilizado como degeneração da natureza, observando o outro com
admiração, como dotado de qualidades. É por isto que Claude Lévi-Strauss
considera Rousseau como fundador da antropologia, uma opinião não compartilhada
pela grande maioria dos teóricos.
Uma vez que, como salientou
Laplatine, não existia ainda uma distinção entre o conhecimento cientifico e
filosófico, com a antropologia inserida fortemente na filosofia especulativa,
carecendo de sistematização metodológica. Além do fato do discurso
antropológico não se distinguir do relato histórico, repleto de um viés
evolucionista, carregado de teor civilizatório europeu como ápice do progresso
cultural. A antropologia teria que aguardar algumas décadas para surgir como
ciência no século XIX.
O NASCIMENTO DA
ANTROPOLOGIA
A corrente mais aceita delimita o nascimento da antropologia vinculada com seu caráter biológico, atribuindo a Charles Darwin seu fomento, circunscrito ao século XIX. Quando se confundiu com o surgimento da sociologia, segundo alguns continuando embaralhada com esta até a metade do século XX, ganhando então espaço e reconhecimento.
Neste sentido, diversos
teóricos afirmam que Jean-Baptiste Lamarck poderia ser considerado o pai da
antropologia no século XIX, visto que sua proposta para explicar o
evolucionismo teria sido usada para entender as diferenças culturais provocadas
pela adaptação dos povos ao meio. No entanto, existe um consenso em considerar
como pai da antropologia o polonês Bronislaw Malinowski; devido ao fat9 de ter
iniciado os estudos etnográficos, trazendo para a área o rigor metodológico
cientifico que ajudou a construir credibilidade acadêmica; como também por ter
transposto o componente biológico, agregando a orientação social, depois
conhecida como antropologia social.
Ao inserir a corrente
funcionalista na antropologia, Malinowski propôs a observação da sociedade e da
cultura como um todo, examinando o contexto social como um organismo vivo, um
ser biológico que deveria ser estudado com objetividade cientifica. Negando o
evolucionismo e sua noção de estágios de desenvolvimento, foi contra o
difusionismo, uma corrente que afirmava que a cultura seria transmitida por
empréstimo, não nascendo no interior da sociedade estudada.
Os estudos do polonês
dominaram o panorama antropológico entre 1922 e 1942, cunhando conceitos,
métodos e técnicas que conferiram à antropologia um status de ciência voltada
para o entendimento da lógica interna de cada cultura, sistematizando o
conhecimento do outro pelo seu próprio prisma.
Teóricos de períodos
anteriores e contemporâneos de Malinowski, por vezes, figuram nos manuais de
antropologia como pais da ciência; como Edward Tylor (1832-1917), Lewis Morgan
(1818-1881), Franz Boas (1858-1942), e Radcliffe-Brown (1881-1955). Embora
estes tenham contribuído para a construção da antropologia; o polonês Bronislaw
(1884-1942), merecidamente, é considerado o pai da antropologia cientifica pela
imensa maioria dos manuais. Foi Malinowski o primeiro a propor a genealogia, a
história de vida e a comparação, como método e instrumental da antropologia. Porém,
existe uma vertente que considera o francês Claude Lévi-Strauss (1908-2009)
como pai da moderna antropologia. A despeito da contribuição do estruturalismo
para área, o centro do conhecimento antropológico, relacionadas ao social, foi
estabelecido por Malinowski. O entendimento das sociedades como sistemas, com
relações de dependência mútua em uma estrutura hierarquizada, características
intrínsecas do estruturalismo de Lévi-Strauss, já estava presente na proposta
de Malinowski. Lévi-Strauss, ao lado de outros, como o linguista Saussure,
agregou novos elementos, configurando a corrente estruturalista e inaugurando a
antropologia linguística; mas não pode ser chamado de pai do amplo contexto
antropológico contemporâneo.
Tendo a antropologia
nascido como estudo das sociedades das sociedades pré-históricas, depois
convertido em observação das ditas sociedades primitivas contemporâneas; ganhou
um tímido contorno de ciência, no século XIX, através da antropologia
biológica, trazendo si a etnologia desde a antiguidade. Entretanto, carecia de
métodos, instrumentais e técnicas cientificas. Ao iniciar a antropologia
cultural, Malinowski fundou a etnografia, propondo a observação participante,
centro da moderna antropologia. Por meio da qual a observação de um povo
necessita da inserção completa do pesquisador dentro do seu objeto de estudo. Ou
seja, é preciso que o antropólogo vivencie as experiências para entender o
outro por seu próprio prisma; justamente o que diferencia a antropologia da
sociologia.
CONCLUSÃO
Interdisciplinar e transdisciplinar, constituindo ciência auxiliar de diversas outras e carecendo de vários segmentos para se compor como ciência; em resumo, a antropologia busca ao conhecimento global do homem, tendo como objeto tudo que lhe diz respeito ao longo de um tempo e espaço amplo. Portanto, estende-se através da geografia, história e sociologia, dentre outras e inúmeras áreas. Aspira a um conhecimento total, aplicável ao desenvolvimento humano desde os hominídeos até os contemporâneos. A antropologia tece conclusões que, percorrendo o entendimento do outro, contribuem para a compreensão das sociedades pós-modernas, do sujeito inserido em sociedade e do mundo contemporâneo.
ANTROPÓLOGOS
FAMOSOS
- Bronislaw
Malinowski (1884-1942) – valorizou o trabalho minucioso e o convívio com povos
nativos como forma de obter informações para o trabalho antropológico.
- Franz Boas
(1858-1942) – estudou vários povos indígenas dos Estados Unidos.
- Claude
Levi-Strauss (1908-) – criador do estruturalismo. Sua obra principal foi “O pensamento
selvagem”.
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