AULA 09 – A REPÚBLICA
OLIGÁRQUICA E A BASE DE SEUS MECANISMOS DE CONTROLE: O CORONELISMO (1894-1930)
A posse de prudente de Morais representou o
principal rompimento na novíssima República. Com ele subiram ao poder todos os
ricos e poderosos latifundiários de todo o país que procuravam, desde a
proclamação, um espaço para comandar a nação.
Nesse
momento, o Estado brasileiro passou a estar atrelado aos interesses das áreas
rurais do país. A política exercida no interior passou a, praticamente,
determinar a estrutura política nacional. No poder dos latifundiários dos
municípios estava o centro giratório das principais relações de poder que
passaram a caracterizar a república oligárquica.
A QUESTÃO DO CLIENTELISMO
As
oligarquias agrárias iniciaram seu processo de dominação através da utilização
de um tipo de poder construído na época imperial. Esse poder foi vulgarmente
chamado pela historiografia de Coronelismo.
Quem eram os coronéis*? Eram donos de vastas extensões de terra do interior do
país. Durante a Primeira República os coronelões estavam concentrados principalmente
na região nordeste e possuíam um sólido esquema de dominação sobre os
habitantes da região chamado de clientelismo.
Essa prática fora construída no campo nordestino
desde os tempos coloniais e tinha sua lógica baseada em uma intensa troca de favores
entre os coronéis e seus agregados (trabalhadores das fazendas), sendo que
entre esses dois sujeitos existia uma série de relações de interdependência que
permaneceram no tempo até a República. O agregado tem o dever de servir o
coronel em variadas tarefas, desde a ajuda nas plantações até apoio nas
possíveis disputas de terras que eram frequentes no interior do país. Em troca
o coronel dispensava um tratamento de proteção em vários sentidos ao agregado, além
de ceder-lhe um pedaço de terra para desenvolver um plantio próprio dentro da
fazenda.
Em
muitos casos, essas relações clientelistas de interdependência entre coronéis e
agregados eram transformadas em relações de parentesco, quando os agregados
permaneciam por gerações nas fazendas dos coronéis ou quando os dois grupos
sociais selavam a aliança familiar através do batismo dos filhos dos agregados.
Dessa forma, os coronéis passavam a ser “padrinhos” daquela criança e daquela
família e os agregados passavam ser seus “afilhados”. Essa relação foi denominada
pelos estudiosos do coronelismo como compadrio.
Na realidade, as relações coronelistas no interior do país eram bastante
baseadas nesses antigos e profundos laços culturais que acabavam formando uma
outra forma de família baseada no compadrio e no clientelismo. O coronel, em
muitos casos, era definido como um “pai” ou “padrinho” de toda uma região e
tinha sob sua “proteção” milhares de pessoas que, em troca, reconheciam e
respeitavam sua autoridade. É a partir dessa lógica que o coronelismo se
transformou em suporte de poder político das oligarquias que dominaram o país
até 1930.
AS FORMAS DE DOMINAÇÃO POLÍTICA DOS
CORONÉIS
Os
laços culturais que uniam há muitos séculos os grupos que faziam parte da
hierarquia de poder nos campos do país começaram a ser ampliadas, na Primeira
República, para formas de dominação políticas direcionadas para manter nas
diversas esferas de poder uma maioria de representantes do latifúndio. Coma
subida ao poder de Prudente de Morais, as oligarquias latifundiárias de todo Brasil
passaram a definir diretamente os destinos da nação. A República tornou-se um
apanágio dos senhores de terras. Entretanto para manter essa estrutura
funcionando em favor das elites agrárias, os latifundiários necessitavam
controlar mais efetivamente o processo que podia lhes tirar o poder: as
eleições.
É nesse sentido que os coronéis se tornaram a base
de efetivação do poder oligárquico pois tiveram a importante função de determinar
a eleição de representantes do latifúndio para a estrutura política nacional (governos
municipais, governos estaduais, congresso nacional e presidência da República).
Dessa forma, os coronéis passaram a usar sua influência social nos municípios
para sempre buscar eleger candidatos favoráveis à continuidade da política
oligárquica em todo país. Mas como intervir nas eleições? Podemos dizer que a
própria organização das eleições** políticas brasileiras naquele momento favoreceram
o domínio oligárquico. As eleições embora fossem “diretas” (ver quadro acima)
eram abertas, ou seja, os votantes definiam a votação na frente das principais
autoridades da região: o juiz, o padre e, acredite, o próprio coronel.
Por
outro lado, os coronéis desenvolveram formas de controle eleitoral que passavam
pela lógica da garantia da vitória de seus indicados ao poder político. Podemos
destacar pelo menos três formas de controle político do coronelismo nesse
momento:
● Voto de Curral
ou Curral Eleitoral: Consistiu em uma forma de controle do voto baseado
na persuasão do coronel sobre seu “rebanho” de eleitores que eram
transportados em grandes grupos para a comarca de votação e lá passavam a noite
em meio a festas e presentes dados pelos coronéis/padrinhos para garantir o
voto do curral para o candidato do latifúndio;
● Voto de
Cabresto: Forma de controle eleitoral baseado na intimidação e
na força que era exercida pelos coronéis sobre os eleitores dissidentes, isto
é, que se negavam a votar no candidato do “padrinho. Essa pressão dava-se na
mesa de votação, pois o voto aberto possibilitava a fiscalização direta do
coronel, e fora dela através da figura do capataz ou “jagunço”, que persegui e ameaçava
o votante com promessas de “viagem” para sempre;
● Voto de Caixão
(fraudes): Esta
forma de controle do voto baseou-se na violação das urnas eleitorais sempre com
o intuito de acrescentar votos ao candidato do latifúndio. Muitas vezes, as
votações recebiam o estranho acréscimo de votos de pessoas que já haviam
morrido, pois os coronéis utilizaram as listas dos necrotérios e cemitérios da
região para reforçar a eleição de seus candidatos. Parece brincadeira, mas o
voto de caixão foi largamente usado para definir eleições municipais, estaduais
e
até
presidenciais durante a Primeira República.
Dessas
três formas, a estrutura política nacional sucumbiu ao domínio desonesto e
permanente das minorias latifundiárias do país. Ficou muito difícil escapar
desses mecanismos de dominação porque enfrentar os poderosos coronéis era, por
vezes, selar mais um espaço no cemitério. A República, portanto, passou a ser
uma extensão do poder rural. Será que mudou muita coisa em relação à política
imperial? Essa pergunta é facilmente respondida se olharmos para os grupos dominantes
dos dois regimes e constatarmos que eram todos latifundiários exercendo o poder
do Estado em benefício de interesses particulares.
O
CONTROLE A NÍVEL ESTADUAL: A “POLÍTICA DOS GOVERNADORES”
Além
das formas de controle eleitoral exercidas a nível municipal, as oligarquias
também desenvolveram um interessante mecanismo de dominação visando monopolizar
os governos estaduais da federação. Essa política ficou conhecida vulgarmente como
política dos governadores e foi
desenvolvida primeiramente no governo do presidente Campos Sales (1898-1902).
Essa
política foi fruto das necessidades das elites cafeeiras de se adaptarem ao
momento de crise econômica que atingiu a produção de café e as exportações do
produto desde a década de 1880. A “grande depressão” que atingiu a Europa entre
1873-1896 praticamente fechou o mercado externo para o café brasileiro e era
preciso armar um mecanismo parta minimizar os prejuízos internamente.
Uma
das soluções urgentes tomadas foi o fechamento das alianças políticas entre as
variadas oligarquias estaduais e possibilitar sua aproximação com o poder
federal. Nesse sentido, as elites agrárias especialmente da região sudeste do
país passaram a construir uma relação mais próxima visando o monopólio dos governos estaduais para facilitar
medidas presidenciais para favorecer os interesses oligárquicos.
Uma troca de apoio político foi selada entre a
presidência e os governos estaduais, em que os governadores apoiavam o
presidente em seus projetos garantindo a maioria de parlamentares indicados ao congresso
nacional e, em troca, o presidente liberaria generosos recursos financeiros
para os governadores estaduais.
Essa
negociação ainda foi intermediada pela Comissão
Verificadora de Poderes, que consistia em um grupo de parlamentares oligárquico
que tinham a função de selecionar os parlamentares vindos dos estados para
conseguir formar a maioria no congresso. Dessa forma, as oligarquias sempre
teriam em suas mãos o poder estadual, legislativo, executivo e municipal, isto
é, toda a estrutura política da República. Essas formas de dominação foram
muitas vezes direcionadas para recuperar a decadente economia do café, que não
parava de acumular prejuízos desde a proclamação da República. Tal foi a oportunidade
de intervir pela primeira vez na economia para favorecer os interesses dos
cafeicultores com o Convênio de Taubaté
(1906), quando o s estados cafeicultores (São Paulo, Minas Gerais e Rio
de Janeiro), mesmo contrariando o presidente Rodrigues Alves, acabaram forçando
compra do excedente de café não exportado pelo Estado Federal (União) e pelos
estados não produtores de café. Esse foi um exemplo de árias práticas políticas
e econômicas que visavam fincar os interesses oligárquicos no país.
A
CONTRADIÇÃO DA REPÚBLICA: O “CAFÉ COM LEITE”
“Política
do café com leite” é o nome dado ao monopólio político sobre a presidência da
República feito principalmente por dois estados: São Paulo e Minas Gerais. Essa
política originou-se de um acordo, uma negociação feita entre os dois mais
fortes partidos políticos republicanos, o PRP (Partido Republicano Paulista) e
o PRM (Partido Republicano Mineiro) feita em 1913 na cidade mineira de Ouro
Fino. O PRP e o PRM representavam as oligarquias mais influentes do país, pois eram
provenientes das elites cafeicultoras que largaram na frente para controlar a
política nacional.
Essa
política tinha como principal objetivo evitar que outras oligarquias
ascendentes naqueles momentos chegassem à presidência, como era o caso do
estado do Rio Grande do Sul, que desde o início do século XX crescia em
importância econômica através da produção para o mercado interno.
Dessa
forma, o “café com leite” serviu como uma forma de definir os presidentes
previamente às eleições e executar um revezamento no poder federal: ora um
presidente paulista, ora um mineiro, sempre através de indicações dos
presidentes predecessores. A união dos dois estados cafeicultores foi tão
sólida que parecia um casamento perfeito; combinavam-se tão bem quanto o café
com o leite e permaneceram na presidência, com relativa tranquilidade, até
1930.
FIQUE ESPERTO:
CORONEL
- Patente militar atrelada à Guarda Nacional
imperial. D. Pedro I, na época das independências, transferiu parte do poder do
Estado para os influentes senhores de terras do interior do Brasil, para exercerem
a função da vigilância e manutenção da ordem social em meio a um contexto de
crescentes revoltas e insatisfações populares.
ELEIÇÕES NA PRIMEIRA REPÚBLICA
- Pela Constituição
de 1891, ficou definido que a república seria representativa e baseada em eleições
diretas e universais. Ficavam excluídos minorias sociais como os analfabetos,
as mulheres, os religiosos e os praças-de-pré (soldados de baixa patente).
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