AULA 01 – O MOVIMENTO
REPUBLICANO
AS PROPOSTAS DE REPÚBLICA
O
movimento republicano apesar de unificado em seu projeto final, não contou com
um sentido de unidade ideológica na condução do movimento e dos debates
teóricos e ideológicos verificados em seu interior. Desta forma, pode-se
verificar três grandes grupos de propostas no interior do movimento republicano
nacional:
a) O
Positivismo: contou com uma ampla adesão dos militares e possuía um grande
divulgador na Escola Militar: o coronel e professor Benjamim Constant.
Corrente
filosófica criada na França no início do século XIX, por Auguste Comte. O
princípio básico do positivismo sustentasse na ideia de que “a sociedade só
pode ser convenientemente organizada através de uma completa reforma
intelectual do homem”. Segundo Comte “todas as ciências e o espírito humano
como um todo desenvolvem-se através de três fases distintas: a teológica, a metafísica
e a positiva”. Para o pensador na fase teológica o homem só consegue explicar
os fenômenos naturais através das ideias de deuses e de espíritos. Na fase
metafísica, a ideia de subordinação do homem ao sobrenatural é destruída e a
imaginação é substituída pela argumentação na explicação dos fenômenos da
natureza. Na última fase, o estado positivo, tanto a imaginação quanto a argumentação
ficam subordinadas à observação científica (positiva).
Do
ponto de vista político, os positivistas negavam a luta de classe, (e este foi
o principal alvo da crítica marxista) por isso afirmavam que “só há progresso
quando as classes estão irmanadas”. Um dos fundamentos da ideologia positivista
baseia-se na ordem e progresso, segundo Comte: “o progresso provém da ordem
e aperfeiçoa os elementos permanentes de qualquer sociedade: família, religião,
propriedade etc.”
No
Brasil, os positivistas influenciaram politicamente as classes médias e seu
principal representantes no debate republicano: os militares do exército. Foi
no exército que se desenvolveu a ideias de salvação nacional, ou seja, a
noção de que cabia ao exército a missão de proteger o país dos vícios e da
degradação política, visão aliás reproduzida em outros momentos da vida política
nacional.
Na
análise positivista, o exército simbolizava a ordem sob a qual se erigiria
o progresso (daí o lema da bandeira: ordem e progresso), a solução
política para o país seria a adoção de uma república ditatorial,
chefiada, logicamente pelos militares. Os positivistas desejavam uma república
moralizadora sem corrupção política, dirigida de forma autoritária e
patriótica. O positivismo tinha muita forte do Rio de Janeiro (com os
militares) e entre os republicanos gaúchos. Não são muito claros os motivos
pelos quais os gaúchos eram fortemente positivistas, mas acredita-se que
concorreu para isso a forte tradição militar naquela região e o fato de que os
gaúchos formavam uma minoria que precisavam de uma forte doutrina que lhes
desse forte grau de coesão interna.
b) O
Liberalismo: Seguindo a tendência do liberalismo norte americano. Os
liberais associavam a república a um modelo
representativo,
eletivo, gerido por uma constituição de caráter liberal, que assegurasse a
liberdade dos indivíduos e o critério de
igualdade perante
a lei e a justiça. Este modelo defendia a adoção de um modelo político composto
por um presidente (eleito por sufrágio universal) que governaria em harmonia
com o Congresso Nacional e o Senado. Esta proposta tinha muita força entre os integrantes
do Partido Republicano Paulista (PRP) e entre os políticos mineiros.
c) O
Jacobinismo: Faziam clara alusão ao jacobinismo francês. Lopes Trovão e
Silva Jardim, seus maiores referenciais, defendiam uma república popular e
democrática. Este grupo aproximava-se dos setores mais populares das cidades do
Rio de Janeiro (maior força) e em São Paulo. Para os jacobinistas a república
deveria ser fruto de um movimento revolucionário que promovessem as mudanças
nas estruturas sociais. Falavam em democracia social, melhoria efetiva para os
negros (entregues à sua própria sorte após a abolição), condições de vida digna
para os trabalhadores urbanos e melhoria das condições de vida para os mais
carentes. No interior do Partido Republicano, eram representados pelos
republicanos radicais ou revolucionários, conforme veremos a seguir.
A
CONSTRUÇÃO DO IDEÁRIO REPUBLICANO
Grande
parte do ideário republicano no Brasil foi divulgado no interior do Partido
Republicano. O Partido Republicano surgiu de uma dissidência surgida no
interior do Partido Liberal, tornando-se de fato um partido republicano em
1870, tendo na sua fundação muitos advogados, médicos, engenheiros,
jornalistas, fazendeiros e negociantes. Já neste ano foi lançado um manifesto,
que definia a finalidade do novo partido:
- Extinção do
Senado vitalício, do Conselho de Estado e do Poder Moderador;
- Separação entre
igreja e Estado;
- Eleições
diretas;
- Instalação de um
regime republicano federativo que asseguraria a autonomia das províncias,
conforme segue trecho abaixo:
MANIFESTO
REPUBLICANO
"A
centralização, tal qual existe, representa o despotismo, da força ao poder
pessoal que avassala, estraga e corrompe os caracteres, perverte e anarquiza os
espíritos, comprime a liberdade, constrange o cidadão, subordina o direito de
todos ao arbítrio de um só poder, nulifica de fato a soberania nacional, mata o
estímulo do progresso local, suga a riqueza peculiar das províncias,
constituindo-as satélites obrigados do grande astro da corte - centro absorvente
e compressor que tudo corrompe e tudo concentra em si - na ordem moral e
política, como na ordem econômica e administrativa. [...] O regime de federação
baseado, portanto, na independência recíproca das províncias, elevando-as a
categoria de Estados próprios, unicamente ligados pelo vínculo da mesma
nacionalidade e da solidariedade dos grandes interesses da representação e da
defesa exterior, e aquele que adotamos no nosso programa, como sendo o único
capaz de manter a comunhão da família brasileira. [...] Somos da América e
queremos ser americanos".
Fonte: A República, Rio de Janeiro, 03/12/1870.
A
partir daí o republicanismo foi tomando corpo no país, com o surgimento de
diversos PR’s nas províncias. Em 1873, na Convenção de Itu, interior de São
Paulo, foi criado o maior propagandista da causa republicana: o Partido
Republicano Paulista (PRP), que juntamente com o Partido Republicano Mineiro
(PRM) dominou a vida política nacional por toda a primeira república. Pode-se falar
de uma forte presença da classe média nos diferentes PR’s, mas em São Paulo,
desde cedo, ficou marcante a presença dos cafeicultores na condução do
movimento. No interior do Partido Republicano, havia duas correntes de
pensamento: os republicanos evolucionistas e os revolucionários.
a) Os
evolucionistas ou históricos: acreditavam que a monarquia sofreria um
constante desgaste, até ser naturalmente substituída pela república. Esta tese
aproximava-se do ideal de república proposta pelos oligarcas de São Paulo. Um
dos nomes fortes da corrente evolucionista era Quintino Bocaiúva, que assumia
claramente uma postura moderada na defesa da ordem e de “conquistas graduais”:
“A República, como nós a queremos [...], tem de ser e
deve ser um governo de liberdade, de igualdade e de fraternidade, de justiça, de
paz, de progresso e de ordem, de garantias para todos os direitos e de respeito
para todos os interesses legítimos. Nossa ordem de ideias e nossa propaganda
tem sido uma propaganda de princípios e não uma propaganda de ódios. Temos
visado e visamos a transformação social pacífica e legal, pelo esclarecimento
da opinião pública e pelas conquistas graduais efetuadas no domínio da
consciência nacional”.
b) Os radicais ou
revolucionários: associavam
a república à participação popular, feita de forma revolucionária, desta forma
eram diferentes dos evolucionistas, pois desejavam apressar a criação da
república no país. Os radicais falavam nas mudanças que o país necessitava da
seguinte maneira:
“A Nação brasileira pede reformas e a monarquia é
incapaz de decretá-las; e quando não vem a reforma que é a revolução governamental;
é mister que se faça a revolução que é a reforma popular!”.
(PESSOA, R. Carneiro, A Ideia Republicana no Brasil
através dos Documentos)
Silva
Jardim, um dos mais ardorosos radicais falava da seguinte maneira: Quase tudo
do que precisamos é importado. O escravo se tornou o novo miserável! Não há
empregos! Não há obras em benefício da população! Não sobra dinheiro. Só para o
leite dos seus recém nascidos, a família imperial recebe o suficiente para
sustentar dez famílias modestas por dez anos! Haja leite! E as despesas com
palácios? E as roupas importadas? A Monarquia é um sistema de governo muito
caro, e com vergonha da nossa pobreza.
Tanto
que nem quer saber dela. Então, por que não ficamos com a República - que eles
dizem não prestar, mas e mais barata?! Porque a República é o governo do povo!
E o próprio povo cuidando do que é seu, da coisa pública. Mas não conseguiremos
isso de graça. Se a revolução abolicionista se fez nos quilombos e fazendas, a
revolução política precisa ser feita nas ruas; e em torno dos palácios do Imperador
e de seus Ministros. Só os homens do povo podem governar os povos! Só os homens
do povo podem erguer um governo do povo! E para isso, não podemos hesitar. Se o
Conde d'Eu tentar hesitar, que seja expulso do país...ou mesmo executado! O
povo no poder! Todo rigor contra a Monarquia parasita! Isso é a República!
O SENTIDO DO GOLPE
A
república brasileira surgiu de um golpe militar que articulou entre si as
aspirações de três grupos sociais. A elite civil formada pelos oligarcas do
café de São Paulo; a elite militar, que contou a adesão da alta cúpula do exército
e os setores médios urbanos. A monarquia estava desgastada sem apoio nas suas
bases, perdera o apoio do exército, da Igreja, do setor economicamente mais
dinâmico da sociedade (cafeicultores de São Paulo) e criticada pelas populações
urbanas. Ademais estava profundamente abalada pelo conjunto das transformações
que marcava o final do século XIX no país e para as quais não conseguia
estabelecer respostas. Desta forma, pode-se afirmar que a república representou
a afirmação política das elites agrárias nacionais, em conformidade como o exército,
que garantiu a vitória do movimento através de uma conspiração golpista.
O GOLPE DE 15 DE NOVEMBRO - TEXTO COMPLEMENTAR
Em 1889, o imperador nomeou o Visconde de Ouro Preto para chefiar o Ministério e tentar acalmar os ânimos republicanos e atender às reivindicações necessárias para neutralizar a oposição. Todavia, a Monarquia já havia perdido o bonde da História e nada mais restava a fazer.
Marechal Deodoro da Fonseca, herói da Guerra do Paraguai, defensor das questões
militares e amigo íntimo do imperador, acabou sendo convencido a liderar o movimento republicano.
Após
uma série de boatos sobre sua prisão, na manhã de 15 de novembro de 1889, Deodoro, à frente de um batalhão, marchou para o Ministério da Guerra, depondo o Gabinete Ouro Preto. Não houve resistência.
Os revoltosos conseguiram
a adesão de tropas
governistas. Deodoro, que estava doente, retirou- se para sua residência e os militares voltaram aos
quartéis. Alguns republicanos, entre os quais José do Patrocínio, preocupados com a indefinição do
movimento, dirigiu-se à Câmara dos Vereadores, proclamando a
República. Patrocínio intitulou-se o “proclamador civil” da República.
NEVES, L. M. B. P. e MACHADO, H. F. O Império do Brasil,
p. 444.
O povo, segundo o jornalista Aristides Lobo, julgava estar assistindo a uma parada militar. E assim nasceu a República Brasileira, com
o povo assistindo, bestificado, a esse acontecimento. Dois dias depois, a Família Real
partia para o exílio na Europa.
O período republicano inaugurado em 1889 costuma ser dividido em:
República Velha – 1889-1930
a) República da Espada – 1889-1894
b) República Oligárquica – 1894-1930
Era Vargas – 1930-1945
República Populista – 1945-1964
Ditadura Militar –
1964-1985
Atual República – 1985
até os dias atuais
HINO DA PROCLAMAÇÃO DA REPÚBLICA
Seja um pálio de luz desdobrado,
Sob a larga amplidão destes céus.
Este canto rebel, que o passado
Vem remir dos mais torpes labéus!
Seja um hino de glória que fale
de esperanças de um novo porvir!
(...)
Nós nem cremos que escravos outrora
Tenha havido em tão nobre País...
Hoje o rubro lampejo da aurora
Acha irmãos, não tiranos hostis.
Somos todos iguais! Ao futuro
Saberemos, unidos, levar
Nosso augusto estandarte que, puro,
Brilha, ovante, da Pátria no altar!
Liberdade! Liberdade!
Abre as asas sobre nós,
Das lutas na tempestade
Dá que ouçamos tua voz!
Letra: Medeiros e
Albuquerque / Música: Leopoldo Miguez
MEMÓRIA DO REPUBLICANISMO NO BRASIL
O
movimento republicano no Brasil contou com uma sólida alegoria em torno da
imagem dos militares e da presença destes no movimento republicano.
Articuladores do golpe, passaram para a maioria dos livros didáticos com uma
mescla de exaltação e “garbo cívico”. Esta exaltação, entretanto, não foi
gratuita. Os militares foram vistos como esteio da nação, tendo sua imagem
associada a um ideal épico de liberdade, inerente a próprio movimento
republicano. Esta visão foi reforçada pelos livros didáticos, pelas festas cívicas
(feriado do 15 de novembro, por exemplo) estátuas públicas, ruas (Belém por
exemplo é a única cidade em que Deodoro é um “generalíssimo”) e monumentos, que
consolidaram esta visão no imaginário social brasileiro.
Além
da figura de Deodoro, recuperou-se a imagem de Tiradentes e acabou por
consolidar um outro militar nacional, Duque de Caxias. O caso de Tiradentes é
singular. Sabe-se que na época da Inconfidência Mineira Tiradentes foi visto e
interpretado como o traidor do monarca e por isso merecedor da condenação e
esquartejamento. A república brasileira retirou Tiradentes do ostracismo e elevou
a categoria de herói nacional em face da carência de um herói para o movimento.
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